“Um café com quatro gotas e meia de adoçante, por favor”
Era o ano de 1992, eu trabalhava no Serviço Social da Indústria, SESI, na função de contínuo (estafeta, office-boy…) na sede nacional aqui no Rio de Janeiro, edifício De Paoli, Centro.
Com 22 anos não tinha consciência de classe ou consciência profissional. Um dia começaram a ministrar cursos de “Qualidade Total”, “5S” e meritocracia. Comiam duas horas da minha carga horária com esse “kaô”, e os chefes metidos pra cacete, faziam cara feia com a presença da “ralé” nos seminários.
Gente que usava bolsas de grife, ternos bem cortados, que gostava de fumar Carlton e beber whisky do bom. Aliás, esse pessoal só falava com a ralé naquelas festas de final de ano, quando se soltavam depois de doidões e pediam um “avião” pra descolar um “brilho”.
Lá em minha alienaçâo e ignorância comecei a viver no mundo da enganação neoliberal, servia cafezinho para os barões da indústria como Mario Amato e Artur João Donato, respectivamente presidentes da FIESP e FIRJAN, entidades empresariais da indústria brasileira.
Um dia, o velho da FIESP, quando ofereci o café, me pediu quatro gotas e meia de adoçante. Com uma bandeja que tinha um bule cheio de café quente, 28 xícaras, 28 pires, 28 colheres, um pote de açúcar e uma garrafinha de adoçante me enrolei todo, quase entornei tudo na cabeça do velho barão da Indústria. Eu ri de nervoso e os outros barões me olharam de cara feia.
E eu alí, ouvindo números da economia brasileira, sobre o produto interno bruto (PIB), inflação, déficit público, financiamento, entre tantas coisas que eu não tinha a mínima ideia do que era, ficava pensando se mais algum empresário presente naquela reunião me pediria gotas fracionadas de adoçante.