O banheiro do burguês
Após ter passado três anos em subempregos como corretor de planos de saúde, repositor de supermercado e de empreendimentos furados como vender “churrasquinho de gato”, em esquinas do bairro do Grajaú, Zona Norte do Rio, consegui em 2001 um emprego de carteira assinada na Universidade Estácio de Sá, como auxiliar de câmera, do Núcleo de Comunicação da faculdade de jornalismo.
Eu tinha como função carregar uma bolsa de equipamentos, tripé e câmera em externas para o operador de câmera, e dar uma de caboman em estúdio, função igual ao que fazia o “Russo”, famoso caboman, já falecido, do programa do Chacrinha e do Faustão.
Era um emprego legal que me levou a fazer jornalismo na universidade.
Numa dessas externas fui convocado para uma gravação na casa do então dono da Estácio, João Uchoa. Um juiz aposentado metido a entender de jazz que fez fortuna quando criou um curso preparatório para concurso público, que anos depois virou uma das maiores universidades privadas do país.
Lá estava eu montando o set e tomando um cafezinho e batendo papo com o patrão. O burguesão morava em uma cobertura triplex na Barra da Tijuca de fazer inveja ao famoso triplex do Guarujá que não é do Lula.
Em determinado momento deu aquela vontade de ir ao banheiro. E no papo com Dr. João mandei logo: “Caríssimo me permite usar seu toalete?”. O velho incrédulo me olhou e apontou onde era o banheiro, lá fui para o espanto da equipe que eu acompanhava no set.
Ao entrar no banheiro me deparei em um local que tinha pelo menos uns 30 metros quadrados, paredes em mármore, belas luminárias e vaso que parecia um trono.
Confesso que fiz o cocô observando aquele luxo todo que considerei muito exagerado com toalhas que pareciam peças de visom. Uma ostentação só. Enquanto aguardava o término da minhas necessidades fisiológicas, eu olhava tudo ao redor. E quando acabei fiz uso de um papel tão macio, depois lavando minhas mãos em uma pia que tinha uma torneira banhada a ouro.
Ao sair meus colegas de trabalho não conseguiam segurar os risos e o Dr. João me perguntou se o banheiro era habitável, pois eu havia demorado 30 minutos.
Ao terminar a gravação cumprimentei o burguesão: “caríssimo parabéns pelo banheiro, muito bom”. No que ele respondeu meio puto com o charuto acesso no canto da boca , “disponha, volte sempre!”.
No final das contas senti que o patrão ficou incomodado por eu ter usado seu banheiro. Na kombi, os meus colegas me chamaram de “cagão abusado”.
E eu pensando: será que serei demitido? Fato que só aconteceu 15 anos depois após copiar um arquivo do Manifesto Comunista em uma auto avaliação anual que os funcionários faziam para a empresa.